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Textos sobre Agricultura madeirense no Diário de Notícias da Madeira (1.ª série, quinzenal - de 9.9.2007 a 13.6.2010; 2.ª série, mensal, de 30.1.2011 a 29.1.2017; 3.ª série, mensal de 26.2.2017 a ...)
Este texto foi publicado no Diário de Notícias, no dia 30 de Outubro de 2022.
Em finais de Junho do presente ano, a Secretaria Regional de Agricultura e Desenvolvimento Rural através da Direcção Regional de Agricultura e Desenvolvimento Rural, tornou público o reconhecimento dos bovinos de origem regional com a designação "Raça da Terra", como Raça Autóctone Portuguesa. Em tempo, a Divisão de Melhoramento Pecuário (DMP) da Direcção de Serviços de Desenvolvimento Pecuário submeteu uma proposta que foi aceite pela Direcção Geral de Alimentação e Veterinária, entidade nacional responsável pela identificação e registo das raças autóctones. Neste âmbito, cabe à DMP gerir o Livro Genealógico de bovinos da "Raça da Terra", ficando a Dr.ª Sara Nóbrega daquele serviço como Secretária Técnica. Este livro é uma base de dados onde constam dados individuais dos animais da ‘Raça da Terra’ como a identificação, a classificação fenotípica (o aspecto do animal tendo em conta certos caracteres hereditários), a ascendência, as análises genéticas, entre outras. No decorrer de seis centúrias de presença humana no Arquipélago da Madeira, o sector da bovinicultura revelou-se crucial para o seu desenvolvimento e como consequência do isolamento geográfico e genético ocorrido nesse período, foi possível demonstrar os laços genéticos dos animais da Região e constatar a existência de uma Raça Autóctone Bovina Portuguesa que merecia ser registada, o que felizmente veio a suceder. Na Madeira, as condições climáticas e de solo, em especial, as existentes na costa norte, possibilitam os pastos ao longo do ano, com erva de características singulares, à qual se acrescentam produtos da agricultura como a folha de bananeira, a palha de cana-de-açúcar, a rama de batata-doce, entre outros, e que são uma notável fonte de alimentação dos bovinos regionais, condição necessária para o sucesso da exploração pecuária.
O nome atribuído, "Raça da Terra", tem base histórica, pois na exaustiva pesquisa bibliográfica realizada, há um trabalho que se destacou dos demais, pelo pormenor e base técnicos, o "Relatório do Veterinário do Funchal" de 1896, da autoria do Dr. João Tierno, publicado no Boletim da Direcção Geral de Agricultura. É de relevar este documento do Dr. Tierno, pois já distinguia os bovinos madeirenses com recurso às características osteológicas (anatomia dos ossos) e zootécnicas (arte que trata da criação e multiplicação dos animais domésticos) que esses animais detinham. Actualmente, já foi possível identificar animais com características fenotípicas semelhantes, tendo sido inventariados 25 animais, dos quais seis encontram-se na Estação Zootécnica da Madeira Dr. Carlos Dória, no sítio das Portas da Vila, freguesia e concelho do Porto Moniz. Iniciou-se o levantamento e a caracterização biométrica de bovinos da "Raça da Terra", para definir o padrão da raça e ao mesmo tempo instituir o regulamento do Livro Genealógico da raça. Depois, seguem-se os estudos genéticos, a determinação da sua origem e distintivos, com vista a um banco genético, onde se assegure a preservação, o aumento e melhoramentos da ‘Raça da Terra’, tornando-a atraente, quer para o produtor, quer para o consumidor. Crê-se que o melhoramento da "Raça da Terra" irá despertar a atenção dos produtores, no que se refere ao interesse na produção e no registo destes animais. Desse modo, estará garantida a perpetuação dos nossos bovinos e respectivos produtos de origem regional, extraordinários e distintos. Em termos de produto final, é de realçar que a carne que se obtém da "Raça da Terra", tem teores mais baixos de colagénio, elastina, tendões e bainhas tendinosas menos firmes, tornando-a mais tenra, de cor mais clara e de sabor peculiar. Este reconhecimento recentemente alcançado dá visibilidade à "Raça da Terra", acrescenta valor aos produtos regionais e cria riqueza aos produtores, contribui para a fixação das populações no meio rural, aumenta a capacidade de auto-abastecimento alimentar e preserva a paisagem humanizada madeirense, moldada ao longo do tempo pelos nossos antepassados.
Que o mercado regional e o consumidor local e visitante sejam sensibilizados para a importância de termos carne de bovino de excelente qualidade, diferente das demais raças e que confira, por exemplo, à espetada, aquele cheirinho e gostinho especial!
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