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Este texto foi publicado no Diário de Notícias, no dia 27 de Novembro de 2022.

Quando nos interessamos por um determinado assunto, além das pesquisas que efectuamos, os familiares, amigos e conhecidos também nos dão a conhecer publicações e autores que desconhecemos e que nos ajudam a aprofundar o conhecimento. Foi o que me aconteceu quando soube da reedição de "Aspectos Económico-Sociais do Meio Rural Madeirense" (2010) de Fernando Luís de Góis, por sugestão do seu filho, Carlos Manuel de Góis. Esta obra, com uma tiragem de 300 exemplares, é uma edição e propriedade dos 14 filhos do autor e teve o patrocínio do Município de São Vicente, sendo que a primeira edição é datada de 1979. O livro está dividido em três partes: "Biografia", a segunda parte com artigos publicados na imprensa regional entre 1952 e 1979, onde se destaca um capítulo intitulado "Problemas do Meio Rural" e a terceira parte com uma dúzia de testemunhos de personalidades do concelho de São Vicente e da Região e a visão de cada filho. Fernando Luís de Góis nasceu a 2 de Maio de 1916, no sítio da Primeira Lombada, freguesia de Ponta Delgada, concelho de São Vicente. Na juventude dedica-se à agricultura e ajuda os seus pais naquela actividade, o que o marcará para toda a vida e moldará o seu carácter, tendo igualmente um particular interesse pela leitura e pela música. Foi Presidente da secção local da Juventude Agrária. Aos 21 anos, principia a recruta militar, mas o seu estado de saúde é abalado com uma pneumonia, acabando por regressar a casa dos seus pais, para voltar a incorporar a escola de recrutas em 1938. Entre 1946 e finais de 1948, foi Regedor, mas dessas funções não guarda «[…] saudades nem recordações algumas […]». Em Outubro de 1946, vai para o Funchal para preparar-se para o exame de Regente Escolar, o que vem a acontecer um ano depois, tendo alcançado a classificação de 14 valores, habilitando-o a ministrar o ensino primário particular rural. De Maio de 1952 até ao final de 1953 tenta melhorar as suas condições de vida em Angola, mas não é bem sucedido, tendo regressado à Madeira. Em Outubro de 1954, reingressa na carreira de ensino, na Escola Masculina da Falca, freguesia da Boaventura, concelho de São Vicente e ali permanece até Julho de 1961. Importa dizer que foi neste período que escreveu artigos sobre o mundo rural, no semanário Voz da Madeira, Diário de Notícias da Madeira e Jornal da Madeira. Foi um dos fundadores da Casa do Povo da Boaventura, cujos estatutos foram aprovados por alvará a 23 de Setembro de 1959. A 15 de Julho de 1963 é nomeado Encarregado da Biblioteca n.º 50 da Fundação Calouste Gulbenkian, abrangendo a costa sul, da freguesia de São Martinho até à Ponta do Pargo, e na costa norte, das Achadas da Cruz até à freguesia de São Jorge. Após o 25 de Abril de 1974, filiou-se no então PPD e confessa-se um admirador de Francisco Sá Carneiro. No final de 1981, aposentou-se e na Páscoa do ano seguinte tem um problema de saúde que o leva a realizar um tratamento, em Lisboa. Entretanto, volta para São Vicente, mas não recupera o seu estado de saúde, tendo falecido a 17 de Março de 1984.

Da segunda parte de "Aspectos Económico-Sociais do Meio Rural Madeirense", salientarei alguns escritos de Fernando Luís de Góis referentes aos "Problemas do Meio Rural", por serem aqueles que estão mais directamente ligados à Agricultura regional. No artigo "Em defesa da lavoura e da economia" de Setembro de 1958, aponta uma produção agrícola madeirense insuficiente para as necessidades de consumo da população devido à área de cultivo ser limitada e de relevo montanhoso, a emigração e «[…] sobretudo falta de apoio e de auxílio moral e material à lavoura». Defende a modernização da técnica agrícola, um melhor aproveitamento dos terrenos agricultáveis e a instalação em cada concelho de uma "Casa da Lavoura" que forneceria aos agricultores sementes e fertilizantes com o reembolso a ter lugar na colheita, possibilitando assim o aumento da produção e do rendimento dos produtores. "A cultura da semilha na Madeira, um problema económico" publicado em Agosto de 1960, comprova a importância deste tubérculo na alimentação dos madeirenses. Porém, dá conta dos elevados custos de produção e da contradição de naquele tempo exportar-se semilha no Verão, quando a Região carecia deste produto. Constata que a criação de uma entidade que armazenasse e conservasse este tubérculo para épocas de escassez, daria garantias ao agricultor e ao consumidor, a preços justos. Os textos "Os interesses de produtores e consumidores" e "A praga dos intermediários" publicados em Dezembro de 1959 e Fevereiro de 1964, respectivamente, tratam de assuntos que ainda são actuais: os preços pagos ao produtor, os preços que o consumidor adquire os produtos agrícolas e certas margens de lucro desmedidas praticadas por alguns intermediários. A "Contribuição para a solução do problema da cana sacarina na Ilha da Madeira", "As Feiras de Gado na Madeira" (referindo-se à do Porto Moniz e à de Santana, cuja primeira edição aconteceu em 1962), "O emparcelamento, problema que interessa à Madeira" e "Acesso à propriedade rústica/ A habitação rural", publicados em Maio de 1975, Setembro de 1962, Agosto de 1959 e Setembro de 1957, respectivamente, são outros bons exemplos da visão de Fernando Luís de Góis, no que respeita à cana-de-açúcar, às Feiras de Gado pelo seu interesse económico e de fomento da pecuária, ao delicado mas pertinente processo de emparcelamento como resolução do «[…] excessivo fraccionamento da propriedade rústica […]» e à impossibilidade de aquisição de terrenos por via do regime de colonia que ainda predominava, não obstante a boa vontade de alguns senhorios em chegar a acordo com os colonos. A terminar, merecem uma leitura atenta os textos "Em prol da economia pecuária madeirense" e "Plano Agro-pecuário da Madeira", publicados em Outubro de 1958 e Outubro de 1965, respectivamente, por conterem informações da época e propostas de soluções para estes sectores, no futuro.

Para compreendermos o que é a Agricultura regional no presente, ler "Aspectos Económico-Sociais do Meio Rural Madeirense" é mais uma maneira de aprender com o passado e projectar o porvir, numa perspectiva de melhorar esta importante actividade económica.

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