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A extinção do regime de colonia

por Agricultando, em 28.04.24

Este texto foi publicado no Diário de Notícias, no dia 28 de Abril de 2024.

No mês em que se assinalam os 50 anos do 25 de Abri de 1974, teríamos de trazer a esta página algo que se relacionasse com o sector agrícola madeirense e que por via do fim da ditadura, passaria por uma grande transformação. Recordamos assim a extinção do regime de colonia. Mas, o que é a colonia? Segundo o Professor Doutor Alberto Vieira no artigo sobre colonia, disponível na Enciclopédia em linha "Aprender Madeira" da Associação de Promoção da Cultura Atlântica (APCA – Madeira), trata-se de «[…] um contrato regulado pelo direito consuetudinário [i.e., o que não está escrito e é só baseado nos usos ou costumes], em que o proprietário da terra a cede a outrem, tendo este a obrigação de a tornar arável, construir as benfeitorias e dar àquele, na altura da colheita, a metade da mesma». O Historiador acrescenta ainda que «este contrato atípico era quase sempre estabelecido de forma perpétua, daí a persistência no tempo desta forma de vinculação à terra da maioria da população rural madeirense». Na Madeira, nos séculos XV e XVI, predominavam os contratos de arrendamento, embora na segunda metade do século XVI, as contrapartidas decorrentes dos resultados das colheitas entre proprietários e arrendatários já fosse "a meias", evoluindo nos séculos XVII e XVIII para o contrato de colonia, que difere daquilo que se considera como um contrato de arrendamento, uma parceria agrícola ou um colonato voluntário. A sua especificidade baseava-se em duas propriedades dependentes entre ambas: a da terra e a das benfeitorias. O senhorio do terreno recebia uma parte dos produtos, variável de local para local, e o colono arrecadava a outra parte dos cultivos, mantendo-se este tipo de contrato inalterável nos séculos XIX e XX. Registe-se que ao longo dos tempos houve contestações por parte dos colonos que achavam a colonia um contrato injusto, mas sem efeitos práticos. Na vigência do Estado Novo, a Junta de Colonização Interna adquiria os terrenos e entregava aos colonos, a quem cabia o pagamento através de empréstimo, situação que aconteceu entre 1944 e 1967, tendo posteriormente sido alterado pela lei dos melhoramentos agrícolas em que o processo de empréstimo tinha lugar entre o senhorio e colono, o que veio dificultar aquele propósito. Depois do 25 de Abril de 1974 e com a criação das Regiões Autónomas dos Açores e da Madeira e dos respectivos governos regionais, é publicado o Decreto Regional n.º 13/77/M de 18 de Outubro de 1977, que extingue finalmente o regime de colonia.

colonia_e_viloes_DR.jpg(Direitos Reservados)

No preâmbulo do Decreto Regional n.º 13/77/M esclarece-se que «o contrato de colonia é específico da Região Autónoma da Madeira». Por isso, determinou-se a extinção dos contratos de colonia, convertendo-os a título transitório para contratos de arrendamento rural, por forma a que houvesse tempo para as necessárias negociações, avaliações e questões financeiras entre senhorios e colonos. Ao segundo, dava-se a oportunidade de adquirir a propriedade mediante uma indemnização acertada entre as partes, ressalvando os casos de senhorios pobres ou de problema habitacional deste. O diploma previa igualmente assistência financeira com orientação do Estado ou da Região, consoante a condição económica do adquirente, para que se facilitasse a transformação das propriedades em regime de colonia para "propriedades perfeitas". O planeamento da agro-pecuária madeirense (em que se recomendava por exemplo o emparcelamento rural em certas zonas) e o ordenamento do território estavam contemplados nesta legislação. Para uma maior percepção do que foi a colonia, sugerimos o documentário "Colonia e Vilões" de Leonel Brito, produzido em 1978 e exibido ao público pela primeira vez no Teatro Municipal Baltazar Dias, a 15 de Fevereiro de 2018. Pode vê-lo na plataforma YouTube e durante uma hora "regressará" à Madeira da década de 70 do século passado e ouvir os testemunhos do colono, António Ferreira, do Pe. Martins Júnior, do Pe. Mário Tavares, entre outros. Fica-se a saber que no início daquela década, com uma superfície agrícola de 20.000 hectares (mais de quatro vezes que a actual, 4.604 hectares), a Região tinha 30 por cento dos terrenos em regime de colonia, ou seja, 6.000 hectares (1,3 vezes mais que a presente área agrícola). Devido à colonia, muitos madeirenses emigraram nos anos 60 do século XX (estima-se que 55.000 o fizeram), à procura de melhores condições de vida.

A caminho dos 50 anos da publicação daquele importante Decreto Regional que fixou a extinção do contrato de colonia, seria de todo oportuno celebrar este marco em 2027, cabendo ao Governo Regional a promoção de iniciativas de divulgação e debate, quer junto da população, quer sobretudo junto dos estudantes do 1.º ciclo ao secundário, para melhor entenderem este passado que moldou o meio rural madeirense e as suas gentes durante séculos.

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publicado às 14:33


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